Posição da ART em um eventual 2º turno
Há 10 dias para as eleições, as
pesquisas e o ânimo político indicam uma possível vitória de Luiz Ignácio Lula
da Silva (PT), ainda em 1º turno.
Por um lado, isso aponta uma
forte rejeição ao Governo Bolsonaro, rejeição essa que, em nosso juízo, é mais
que legítima, tal como explicaremos mais adiante. Por outro lado, a
possibilidade de Lula vencer no 1º turno não nos exime de apresentar de forma
contundente qual a posição que acreditamos que os marxistas devem adotar em um
eventual 2º turno, entre Lula e Bolsonaro.
Essas eleições, de maneira geral,
estão marcadas por campanhas mornas, sem nenhum entusiasmo popular. Com mais de
33 milhões de desempregos, outros milhões de subempregados, famintos
perambulando pelas ruas das capitais do país, inflação a corroer os salários, a
classe trabalhadora irá às urnas sem expectativa que o resultado eleitoral irá
mudar substancialmente sua vida. A hipotética vitória de Lula ainda no 1º turno
reflete muito mais uma enorme rejeição a Bolsonaro do que uma esperança em
Lula. O sentimento de “ter que escolher” o menos ruim entre dois projetos
igualmente ruins, é o sentimento que explica o estado de ânimo da maioria dos
trabalhadores.
Entendemos e acompanhamos esse
gigantesco rechaço a Bolsonaro. O Governo Bolsonaro foi o principal responsável
pela morte de mais de 600 mil pessoas por Covid 19, é o office-boy das
mineradoras transnacionais, do garimpo e dos latifundiários que destroem a
Amazônia, por tentar um golpe de Estado no 7 de setembro de 2021, também é
responsável direto por ataques violentos contra às pensões e às aposentadorias
dos trabalhadores, por meio da Reforma da Previdência. Além disso, seu reacionarismo
alimenta ações de ódio permanente contra os trabalhadores pobres não-brancos
nas periferias do Brasil, contra os jovens e trabalhadores LGBTs, contra as
mulheres trabalhadoras, etc.
Por essa razão, nós da ART defendemos antes e durante as eleições que Bolsonaro e, seus asseclas
militares, sequer deveriam concorrer ao pleito, que deveriam ser derrotados nas
ruas pelas mãos dos trabalhadores, tal qual o bolsonarismo deveria ser varrido
do país por uma ação firme dos trabalhadores, em enfretamento direto com esses
setores.[1]
Por isso, a ART participou de todos os atos pelo “Fora Bolsonaro”.
Ocorre, no entanto, que esses atos foram pouco a pouco esvaziados pela
principal organização política do regime democrático burguês – o Partido dos Trabalhadores
(PT).
Foi por iniciativa do PT que
Bolsonaro não foi derrotado nas ruas. Basta lembrar que o próprio Lula foi
contra chamar o impeachment de Bolsonaro. Nas palavras de Lula “Eu tenho
alertado o PT ter paciência, porque nós temos que esperar quatro anos. A não
ser que ele [Bolsonaro] cometa um ato de insanidade, cometa um crime de
responsabilidade, a gente então possa fazer o impeachment dele, mas se não
fizer isso, nós não podemos achar que nós podemos derrubar um presidente porque
não gostamos dele.” [2]
E por qual motivo, o PT,
supostamente principal oposição a Bolsonaro, não quis derrubá-lo nas ruas,
mesmo depois de Bolsonaro ameaçar diversas vezes um golpe de Estado, mesmo
Bolsonaro incitando os bolsonaristas a atacarem violentamente os militantes e os
simpatizantes do PT? Porque a direção petista sempre soube que a única maneira
de Lula voltar ao poder era tendo Bolsonaro como opositor eleitoral. A direção
do PT sabe melhor que ninguém que a vitória de Lula só é possível em uma
conjuntura marcada por enorme desgaste político de Bolsonaro, desgaste provocado
pela crise sanitária e econômica entre as camadas mais pobres da classe
trabalhadora e pelo o medo, que as redes lulistas alimentam entre a classe
média “ilustrada”, de Bolsonaro dar um “golpe fascista”.
A respeito da crise econômica que abala o
Governo Bolsonaro e que impulsiona agora a candidatura de Lula, afirmarmos com
toda a segurança que essa crise seguirá e que quem pagará a sua conta serão os
trabalhadores.
Ao lado de Lula, Henrique Meirelles,
representante dos grandes bancos, não hesitou em dizer que o país precisará de uma
Reforma Administrativa rigorosa e do fechamento de estatais. Em português claro o
que isso significa? Significa que os banqueiros sabem que Lula atacará os trabalhadores que atuam no serviço
público, tais como garis, professores, coletores de lixo, funcionários da saúde
pública, bombeiros, ou seja, todos aqueles trabalhadores que fazem milagre no
dia a dia para que o Estado atenda minimamente os demais trabalhadores, que Lula chamará
esses trabalhadores de “privilegiados” para agradar os capitalistas que financiam sua campanha e toda ordem de burguês sanguessuga que
vive do sangue e do suor da classe operária brasileira. Os banqueiros apoiam Lula porque sabem que será para eles que o petista governará.
Lula promete preservar a Amazônia
e os povos originários, mas a verdade é que o próprio Lula defende o projeto de
Belo Monte, hidroelétrica que destruiu vasto território dos povos do Rio Xingu.
O candidato petista jura que irá criar um “Ministério Indígena”, mas esconde
que foi em sua gestão que a mineradora canadense Potássio do Brasil recebeu
concessão para explorar e destruir as terras do povo mura, em Autazes (AM),
esconde que é o seu partido – o PT – que, na pessoa pública do deputado
estadual Sinésio Campos (AM), quem lidera a regulamentação da mineração em
terras indígenas, esconde que está aliado com Romero Jucá, ex senador por
Roraima e um dos principais inimigos do povo yanomami.
E por qual motivo um possível
Governo Lula será tal como Bolsonaro um inimigo brutal dos trabalhadores? Em
primeiro lugar porque Lula, assim como Bolsonaro representam os mesmos
interesses de uma determinada classe social – a burguesia, ainda que exponham
esses interesses de forma diferente, porque são representantes da classe dos
capitalistas (donos das grandes redes de comércio, donos de bancos, grandes
proprietários de terras, donos de grandes redes de serviços, donos de grandes
fábricas nacionais estrangeiras). Por trás da campanha de Lula há banqueiros e
grandes empresários que seguem lucrando às custas da fome, do desemprego e do
desalento de milhões de trabalhadores.
Em segundo lugar porque o sistema
capitalista atravessa uma crise econômica sem precedente[3]
que exige uma reconfiguração dos países na produção capitalista global. Isso
significa que o candidato da burguesia que assumir a presidência terá que fazer
o que a burguesia internacional e nacional deseja. Em outras palavras significa
que o Brasil, que é o maior parque industrial da América Latina, será quase
totalmente desindustrializado, milhões de operários serão demitidos e a
economia se voltará para a produção e exportação de bens-primários (soja,
minério, madeira, carne, etc.), isto é, para ramos produtivos que menos
empregam, pagam péssimos salários, degradam o meio ambiente e que provocam
conflitos violentíssimos nas áreas rurais contra camponeses pobres. Lula, como
candidato favorito do capital, será quem coordenará esse projeto e o fará
mediante um significativo endurecimento do regime político, ou seja, usará
todos os aparatos de repressão do Estado capitalista (judiciário e forças
repressivas) para atacar as organizações de trabalhadores que se contraponham a
esse projeto nefasto.
Por isso, ao contrário daquilo
que quase toda a esquerda brasileira afirma (PSOL, PC do B, PT, etc.), um novo
Governo Lula não será um “governo de esperança”, mas sim um governo ainda mais
violento do que suas gestões passadas, nas quais Lula mandou construir a
Hidroelétrica de Belo Monte em cima de comunidades tradicionais, fez a Reforma
da Previdência que retirou direitos dos trabalhadores do serviço público,
enviou tropas, sob o comando do General Augusto Heleno, para invadir e
massacrar o Haiti, país irmão proporcionalmente mais negro e pobre das Américas,
e promoveu o maior encarceramento da juventude pobre e não-branca em toda a
história do Brasil.
Por fim, há trabalhadores que,
mesmo consciente de tudo isso, optarão em votar em Lula com medo de um “golpe”
de Bolsonaro. Mais uma vez reafirmamos que compartilhamos da repulsa ao Governo
vigarista de Jair Bolsonaro e compreendemos esse sentimento de medo presente em
muitos ativistas. Afinal, desde que assumiu, Bolsonaro mantém intenções golpistas
e tenta alimentá-las por meio das Forças Armadas e de milícias. Mas entre as
intenções e a força política de Bolsonaro há uma distância enorme.
Como alternativa à crise política
que se instalou no país desde 2013 e que provocou um gritante desgaste das
forças políticas tradicionais, o alto escalão das Forças Armadas, que na
história do Brasil sempre foi também uma força política, usou uma figura
pitoresca, mas com relevante popularidade para ocupar o vazio de poder
instalado pelas manifestações de 2013, profundado pela queda de Dilma em 2016 e pela
prisão de Lula em 2018. Essa figura foi Jair Messias Bolsonaro. Mas o certo é
que quem governou o país durante o Governo Bolsonaro foi ninguém menos que os
militares que ocuparam mais de 6.000 cargos civis e dezenas de estatais
estratégicas. Isso significa, por um lado, que toda a desgraça que o povo
brasileiro viveu durante a gestão genocida de Bolsonaro é de inteira
responsabilidade do alto escalão das Forças Armadas, pois foram os militares
quem governaram efetivamente. Por outro lado, isso significa que Bolsonaro não
pode dar um passo independente da vontade das Forças Armadas e essas não estão
com disposição de se aventurar em um golpe militar, visto que na hierarquia
social as Forças Armadas estão subjugadas ao grande capital e tanto o capital
internacional como o capital nacional não precisam de uma ditadura, nesse
momento, para manter seus lucros e a alta taxa de exploração contra os
trabalhadores, basta observar a posição dos grandes bancos e do imperialismo
estadunidense que, junto com a esquerda degenerada, estão a defender “Estado
Democrático de Direito Sempre”.
Isso não significa que o estado
de ânimo dos capitalistas não possa mudar nos próximos anos e que a burguesia
em seu conjunto não venha a incidir sobre as forças de repressão do Estado para
tentar esmagar qualquer levante operário. Afinal, estamos diante de uma
combinação entre crise econômica, política e social, e em tais situações as
revoluções e as contrarrevoluções caminham juntas. Por essa razão, insistimos,
independentemente de quem vença as eleições, o que está colocado para a classe
trabalhadora é a necessidade de autodefesa com a formação de esquadrões
operários e campesinos para enfrentar as milícias fascistóides e também o
Estado burguês, tanto nas áreas urbanas como nas áreas rurais. Essa política é
bem distinta da política adotada pela esquerda liberal que diz “vote em Lula
para derrotar Bolsonaro”. Nós da ART dizemos: lute e derrote o capital,
seja ele representado por Lula ou Bolsonaro, porque mais cedo ou mais tarde o
capital empunhará suas armas contra nossas cabeças e de nossos filhos.
Ainda é desconhecida a posição dos
únicos partidos que apresentaram no 1º turno candidaturas majoritárias genuinamente da
classe trabalhadora. PSTU, UP e PCB se mantêm em silêncio até o momento. Mas o
certo é que não cabe aos verdadeiros marxistas serem mercadores de ilusões. A conciliação
entre a classe trabalhadora e o capital, pregada por uma esquerda em grave estado
de putrefação, não é apenas não-marxista, mas antimarxista, contrarrevolucionária
e cúmplice da barbárie que se abate e que se aprofundará contra os trabalhadores
brasileiros.
Por isso, sem nenhuma crença no
projeto dois candidatos da burguesia, nosso voto em um eventual 2º turno será
nulo.
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