Diante da tragédia eleitoral no Estado do Espírito Santo, a única saída é o voto nulo


 

Nesse breve texto, as e os militantes da Marx Brasil no estado do ES analisam a conjuntura no estado e as trágicas escolhas das organizações de esquerda nessas eleições que não só não servem para organizar nossa classe como semeiam ilusões e confusão que irão cobrar um preço em curto prazo.

O descalabro é tanto que é difícil achar a pior chapa. PT e PCdoB apoiam o terceiro mandato de Renato Casagrande (PSB), um governador que reprime violentamente os movimentos sociais desde seu primeiro mandato. Não nos esquecemos do Pinheirinho capixaba, a trágica desocupação da comunidade de Vila do Riacho, em Aracruz. Esse violento despejo levou à morte de uma moradora, Dona Santa, que infartou ao ver as máquinas destruírem sua casa. A moradora era cardíaca e a polícia a impediu de pegar seu remédio em casa antes da demolição. Ela foi assassinada e Renato Casagrande tem suas mãos sujas do seu sangue! Também são inesquecíveis as cenas da polícia de Casagrande bombardeando a Ufes com bombas de gás, atingindo até mesmo crianças que estavam em excursão lá. Casagrande também impôs um retorno precoce às aulas durante a pandemia, colocando em risco maior ainda estudantes, servidores e familiares.

Como se Casagrande não fosse suficientemente ruim, seu vice é simplesmente o ex-senador Ricardo Ferraço, o relator da famigerada Reforma Trabalhista de Michel Temer, filho do velho coronel Theodorico Ferraço e enteado da deputada bolsonarista Norma Ayub.

Pra completar essa salada de frutas do mal, a senadora da chapa é Rose de Freitas, que votou no Congresso a favor de todos os ataques aos trabalhadores, desde o governo FHC, passando por Lula e Dilma, Temer e Bolsonaro!

É uma vergonha! Mas não é a única. Sigamos para analisar

A famigerada chapa “secreta” Rede-PSOL

Embora os militantes do PSOL do ES se façam de desentendidos e tentem de todas as formas esconder, existe uma Federação nacional desse partido com a Rede. Ou seja: em todas as eleições dos próximos 4 anos esses dois partidos estarão coligados. A Rede é um partido burguês com vários políticos reacionários e até mesmo fundamentalistas sob sua legenda. No ES isso é emblemático: o candidato da Rede-PSOL é o ex-prefeito da Serra Audifax Barcellos que, além de neoliberal e perguidor de servidores, é mais um picareta fundamentalista que usa da religião para enganar o povo, além de perseguir as religiões de matriz africana.

Desde a primeira vez que assumiu a gestão do município, Audifax fez inúmeros cortes em áreas sociais, como saúde, educação, assistência social e segurança. O prefeito trabalha com a política do Estado Mínimo, sucateando a máquina pública como justificativa para privatizar serviços essenciais à população, prejudicando diretamente o povo mais necessitado. Além disso, os problemas da Serra são agudizados na eterna dobradinha ente Audifax e seu antecessor/sucessor, Sérgio Vidigal (PDT), numa sequência trágica que precisa ter um fim.

Outra “marca” de suas gestões é a cooptação de lideranças comunitárias. Os líderes se rendem as imposições do prefeito para obter em troca benefícios para os seus bairros. Para reforçar esse aspecto, Audifax determinou que os moradores estavam impedidos de fazer toda e qualquer solicitação diretamente à prefeitura, independente do órgão. As lideranças seriam a ponte entre os moradores e o prefeito, até mesmo para poda de uma árvore!

Em relação as ideias divergentes de servidores, movimentos populares e grupos políticos, Audifax praticou e enalteceu uma política de perseguição e “caça aos inimigos”, inibindo a pluralidade e participação popular. Com Audifax, a máquina pública foi utilizada escancaradamente a serviço do seu partido (a Rede), seus apoiadores e “amigos”, enquanto grande parte da população do município da Serra ficava na penúria, amargando altos índices de violência, em especial contra as mulheres e os jovens negros.

É esse péssimo prefeito, que impôs na Serra uma política de cabresto e compadrio, agravando os problemas sociais do município mais operário e mais populoso do ES, que encabeça a chapa “secreta” do PSOL nessas eleições. Como Rede e PSOL estão coligados, você pode votar em uma candidatura do PSOL e eleger um parlamentar da Rede. Votar numa feminista e eleger um militante anti-aborto, numa trans e eleger um transfóbico, votar numa militante do movimento negro e eleger um racista religioso... Assim, apesar de existirem companheiras e companheiros de luta na chapa do PSOL-ES, essa pavorosa escolha oportunista nos impede terminantemente de apoiar qualquer desses nomes.

Além disso, o PSOL está na coligação nacional de Lula e Alckmin, e de forma nada crítica. Não está chamando a votar em Lula para derrotar Bolsonaro como um "mal menor". Pelo contrário, está em uma campanha completamente descolada da realidade, ajudando a iludir a classe trabalhadora e mentindo descaradamente sobre qual será o caráter do governo Lula/Alckimin/Meirelles: um governo burguês e inimigo dos trabalhadores, que não irá rever nenhuma das reformas neoliberais e que ainda irá ampliar os ataques.

Essa postura de capitulação completa ao PT é uma vergonha ainda maior quando lembramos o que levou à fundação do PSOL: Lula fez uma Reforma da Previdência que privatizou a previdência dos servidores públicos, aprovada com a compra de deputados através do mensalão. Os parlamentares do PT que, coerentes com sua história, votaram contra a Reforma, foram expulsos do PT por exigência de Lula. Esse apoio acrítico a Lula constrange mesmo quem nunca foi desse partido!

 Vale notar que agora também outro setor de militantes expulso do PT se juntou recentemente ao PSOL. Como os mais antigos se lembram, o PSTU se originou a partir da expulsão da Convergência Socialista do PT em 1992, porque essa corrente defendia o Fora Collor, contrariando a orientação de Lula, Zé Dirceu e cia. A Resistência, tendência interna do PSOL, se originou de uma ruptura à direita do PSTU, e também não se sente nem um pouco incomodada com sua história e apoia Lula até mais apaixonadamente do que os militantes mais antigos do PSOL.

Mas a tragédia da esquerda capixaba não é só essa, ainda resta

 A escandalosa chapa PSTU-PSOL-PCB-PM

Mais vergonhoso do que partidos reformistas como PT e PSOL apoiarem Casagrande ou Audifax. assumida ou veladamente, é organizações que se reivindicam revolucionárias como PSTU e PCB apoiarem um oficial da PM ao governo do ES.

As forças policiais (em especial a PM, mas não só) são os cães de guarda da burguesia, os modernos capitães do mato. Não são organizações reformáveis ou disputáveis por dentro. Se, para os marxistas, não é possível reformar o Estado burguês por dentro, o que dirá o seu aparato repressivo! Isso deveria ser ponto pacífico de tão primário que é! Trotsky (e até o último informe que temos, o PSTU se reivindica trotskista) afirma categoricamente:

 O fato de os agentes de polícia terem sido recrutados em grande parte entre os social-democratas não quer dizer absolutamente nada. Aqui também a existência determina a consciência. O operário que se torna policial a serviço do Estado capitalista é um policial burguês, e não operário. Durante anos, estes policiais tiveram que lutar muito mais contra os operários revolucionários do que contra os estudantes nacional-socialistas (fascistas). E tal escola não passa sem deixar traços. O mais importante, porém, é que todo policial sabe que os governos mudam, mas a polícia fica.” (Leon Trotsky – Revolução e Contrarrevolução na Alemanha. Grifo nosso)

Se o PSTU acha que Trotsky está errado, ou esse partido acha que a polícia militar no Brasil tem um caráter diverso desse, cabe a eles explicar. Para nós, de Marx Brasil, Trotsky está certíssimo e o que esse partido faz é esconder (até de seus próprios militantes) a verdadeira política do trotskismo.

O que nós vemos, com muita tristeza e vergonha alheia, é uma “unidade de ação” com aqueles que mataram a Dona Santa, Genivaldo, Cláudia, aqueles que sumiram com Amarildo; a organização criada para reprimir os escravizados que se rebelavam contra seus exploradores e segue sendo, além de um pilar fundamental do sistema capitalista, a principal instituição do racismo estrutural, a grande operadora do genocídio negro em nosso país! A polícia (e não só a PM) é racista, machista, miliciana, burguesa, assassina de pobres, negros e LGBTS. O mesmo PSTU que dizia (corretamente) que não dá pra disputar o Estado burguês por dentro, agora quer disputar não só o Estado por dentro, mas SUA INSTITUICÃO MAIS REACIONÁRIA! É como se, no século XIX, se propusesse unidade de ação entre os quilombolas e os “capitães do mato antifascistas”! Essa unidade de ação é para que mesmo?

Como se rasgar o programa do trotskismo não fosse suficiente, isso foi feito para ceder legenda a um militante do PSOL, da corrente Revolução Brasileira. Essa corrente (que considera cotas para negros e negras como migalhas e que frequenta lives de organizações neofascistas como a Sol da Pátria) anunciou que defenderá o voto nulo para presidente da República. Ou seja, o candidato do PSTU-ES não só não vai votar na candidata a presidente do PSTU como, além disso, defende o voto nulo! Candidata essa que, por sinal, num triste episódio, veio ao ES saudar a candidatura do “Capitão do Povo” capixaba e nem se lembrou de defender o fim da PM, medida insuficiente, mas que está no programa de sua própria candidatura à presidência.

A esquerda capixaba, com as bênçãos de suas direções nacionais, gestou a candidatura de um PM do PSOL, pela legenda do PSTU, apoiado pelo PCB e que defende o voto nulo pra presidente! Uma bizarrice tamanha que não tem precedente conhecido por nós.

Frente a todo esse triste cenário, só nos resta lamentar a falência das organizações de esquerda atuais, em particular no ES. Vivemos um cenário gravíssimo de crise mundial do capitalismo, com brutal degradação das condições de vida e trabalho da nossa classe e acelerada destruição do meio ambiente, colocando em risco a própria sobrevivência da humanidade a médio prazo. Frente a isso é mais do que lamentável constatar a absoluta inexistência de organizações a altura da tarefa gigantesca que está colocada para a nossa classe.

Nós de Marx Brasil, uma organização pequena, embrionária, fundacional, nos colocamos na luta para ajudar a superar a dispersão da esquerda, resultado de tantas e tão vergonhosas capitulações. Nacionalmente, chamamos o voto crítico em Vera Lúcia e Raquel Tremembé, do PSTU, como forma de alavancar alguma ação unitária de nossa classe. Mas, no ES, como demonstra essa breve exposição, a política da esquerda é terra arrasada. A única política séria, pra quem tem uma visão marxista do mundo, é votar nulo nessas eleições. É uma tragédia!

 

Comentários

Postagens mais visitadas