Porque votaremos nulo em toda Amazônia


Declaração Marx Brasil (Belém-Manaus) 

Em nenhum outro canto do Brasil é possível observar o avanço destruidor do capitalismo como na Amazônia, em nenhum outro canto do Brasil a ausência de organização política independente da classe trabalhadora é tão latente.

Da invasão e espoliação dos territórios comunais dos povos originários à criação de um parque minerador para alimentar a cadeia produtiva mundial, do desmatamento desenfreado à consolidação de um lumpemproletariado destituído de qualquer condição humana e de direitos trabalhistas nos garimpos, na pesca ilegal, no extrativismo, no tráfico, tudo o que fere de morte entre as bambolinas das árvores da maior floresta tropical da Terra está organizado dentro da lógica da acumulação capitalista em escalas planetárias. São dos rios amazônicos, sangrados pelo mercúrio, pelo rejeito e pela radiação que escorrem os insumos para a chamada indústria 4.0, edificada no Norte da América e no Pacífico. É sobre o corpo da floresta abatida que surge a soja e pasta boi que alimentam um vasto exército de operários que produzem em condições semiescravas, na China e na índia, os ultramodernos celulares da APPLE, os requintados tablets da Samsung, o cabeamento interno que garante a inteligência artificial presente nos notebooks da Microsoft, a energia “limpa” dos carros elétricos da Cherry, Nissan, Renault, etc. 

A destruição da floresta e a destruição espiritual e física do Homem amazônico estão intrinsicamente ligadas àquilo que há de mais avançado e sofisticado no desenvolvimento capitalista em termos globais. Ou seja, ao contrário das percepções ingênuas que resumem a região amazônica a um lugar idílico e isolado, no qual todos os males derivariam de sua “falta de civilização”, a Amazônia no atual contexto histórico é, mais do que qualquer outro lugar do país, o rincão brasileiro mais articulado com o sistema de acumulação global, razão pela qual é para onde se volta as a cobiça das facções capitalistas e a atenção de seus agentes políticos institucionalizados, isto é, os aparatos ideológicos e repressivos do Estado Burguês.

Sob a batuta das Forças Armadas, principais instituições na Amazônia, a região registra nada menos que 97% das áreas de conflitos agrários no Brasil, 77% dos conflitos que ocorreram no país pela posse de terras e recursos hídricos, 2.500 requerimentos de mineração em terras indígenas, 83,3 milhões árvores derrubadas por mês, 2,8 milhões por dia, 116 mil por hora, 2.000 por minuto, 32 por segundo. Soma-se a isso, a atuação de grupos de extermínio (milícia e tráfico) que atual nas grandes cidades da região, como na periferia de Manaus e de Belém, alimentando-se da miséria desenfreada de uma população que oscila entre os trabalhos informais e os trabalhos formais baseados na superexploração, como aqueles oferecidos na Zona Franca de Manaus.

Principal força institucional da região, os militares, por omissão ou explícita cumplicidade, regem o cenário de horror que se instalou no interior e na área urbana amazônica. Das fronteiras por onde entram as armas e as drogas ao lobby para a atuação das grandes mineradoras, lá estão os militares como sujeitos políticos que decidem a vida e a morte na Amazônia. No entanto, o certo é que em tal orquestra de horror os militares não atuam sozinhos, senão que em perfeita sintonia com os partidos da ordem.

A cota dos partidários e correligionários de Jair Bolsonaro no aniquilamento da Amazônia pode ser traduzida na sincera truculência daqueles que defendem abertamente a não-demarcação das terras indígenas e quilombolas, defendem a devastação feita pelo agronegócio, participam ativamente da criação de milícias de garimpeiros na Terra Yanomami e na Terra Munduruku, atacam servidores da FUNAI, da ICMBIO e do IBAMA.

Quanto ao Partido dos Trabalhadores (PT) e do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) para além da herança de Belo Monte (Belo Monstro) construída durante o Governo Lula, sua contribuição é sem alarde, mas se manifesta também na articulação das grandes mineradoras e dos garimpeiros, na pessoa pública do deputado petista Sinésio Campos, de Clóvis Curubão, prefeito petista de São Gabriel da Cachoeira, propulsores da Frente Pró-Mineração em Terras Indígenas e na pessoa pública da ex-senadora Vanessa Grazziotin, defensora da pavimentação da BR319 que devastará ainda mais os territórios indígenas para escoar produção do agronegócio.

Do Partido Democrático Trabalhista (PDT), vem a promíscua relação entre o mais enraizado ente da federação e o crime organizado, como o envolvimento do prefeito de Jutaí (AM), Pedro Macario Barboza, com o garimpo ilegal.

Do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), na pessoa pública de Edmilson Rodrigues, prefeito de Belém, eleito com o apoio do PSTU e do PCB, vem a retaliação às organizações dos trabalhadores, como aos professores grevistas que tiveram seus salários cortados, em maio.

A respeito dos partidos genuinamente formados por trabalhadores, é preciso que se diga que ou esses têm uma presença artificial na Amazônia, demonstrada na ausência programática do PCB, da UP e do PSTU para a região ou têm uma atuação exclusiva nas máquinas dos sindicatos, dialogando politicamente com os trabalhadores de suas bases sindicais apenas nos períodos eleitorais. Nada que expresse minimamente a centralidade e a urgência com que a luta em defesa da Amazônia deveria ser tratada pelas organizações dos trabalhadores. O próximo ciclo do capitalismo e própria sobrevivência da humanidade estão em jogo na Amazônia agora. Assim é imperdoável essa omissão por parte dessas organizações.

Por fim, há quem pense que a solução para a Amazônia está na “representação indígena” no parlamento ou em Ministérios por meio desses e outros partidos da ordem burguesa. Não nos iludimos. A questão central e, portanto, de essência dos povos originários amazônicos, e de todos os povos originários das Américas, é a terra e seu uso comunal. Os povos indígenas somente poderão se manter como povos do puxirum, forjados numa coletividade ancestral, na solidária orgânica e na harmonia com a natureza, se mantiverem um território comum e, principalmente, se mantiverem relações de produção que ainda não estão baseadas na exploração de um ser humano sobre o outro. Em outras palavras, os povos indígenas só podem existir enquanto povos se conseguirem evitar o avanço da propriedade capitalista e o avanço de suas relações, visto que a propriedade do capital e a propriedade comunal indígena não são formas de propriedade apenas opostas, mas sim antagônicas, ou seja para que uma exista a outra necessariamente precisará ser destruída.

É nesse sentido, que candidaturas de indivíduos indígenas, financiadas por banqueiros e grandes empresários não servem para a essência da luta dos povos indígenas, tampouco para os trabalhadores amazônicos, em geral, tal como infelizmente é a candidatura de Vanda Witoto (Rede Sustentabilidade), financiada pela família Moraes Salles, dona do Itaú-Unibanco.

Por essa razão, e sem nenhuma ilusão nos partidos da ordem que fazem parte da orquestra do horror regida pelos militares em nome do capital nacional e transnacional na Amazônia, defendemos o voto nulo em todos os Estados Amazônicos e para todos os cargos eletivos locais (governador, senador, deputado federal e deputado estadual).

Não acreditamos que os problemas amazônicos possam ser resolvidos nas urnas, por isso defendemos a autodefesa e autodeterminação dos povos originários, expropriação de todas as fábricas da Zona Franca de Manaus, sob controle dos trabalhadores, escala móveis de horas de trabalho em todas unidades fabris de Manaus, Macapá, Boa Vista, Belém, Porto Velho, Cuiabá e Rio Branco para evitar o deslocamento de trabalhadores para o garimpo, pesca, extrativismo madeiros e outras atividades degradantes, escala móvel de salários para que os trabalhadores não sejam aliciados pelas milicas e redes de narcotráfico, justiçamento popular para os mandantes e executores de crimes contra as lideranças campesinas, quilombolas, indígenas e ribeirinhas, autodefesa das mulheres trabalhadoras contra a rede de tráfico humano que atua na região e contra abusadores, em geral, expropriação de todo o capital das grandes mineradoras que atuam na região e reversão do seu capital em prol do reflorestamento e das condições básicas da população ribeirinha, articulação entre os trabalhadores e os povos originários dos 9 países que formam a Pan-Amazônia em defesa dos recursos hídricos e dos territórios contra os projetos das mineradoras nacionais e imperialistas na região, etc.

Acreditamos que o papel dos revolucionários nessas eleições é levantar todas essas as pautas sob um programa de independência de classe e de mobilização nas ruas, assim reforçamos nosso voto crítico na chapa formada pela socióloga Vera Lúcia (PSTU) e pela professora indígena Raquel Tremembé, chapa que, em nossa avaliação, representa em âmbito nacional uma tentativa de unidade necessária entre o movimento operário e o movimento indígena contra o capital.

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