Náufrago na Ilha do Marajó: crônica de uma tragédia anunciada

 

Declaração ART (Belém) 

No dia 08 de setembro de 2022, às 9 horas da manhã, a lancha Maria de Lourdes naufragou em frente a ilha de Cotijuba, no trajeto entre a ilha de Marajó e a capital do Pará, Belém.

 Até o momento, 14 corpos foram encontrados e calcula-se que haja 26 desaparecidos, mas esse número é estimado, pois não havia um controle do número real de passageiros na embarcação.

 A lancha que naufragou era uma embarcação clandestina, pertencente à pequena empresa M. de Souza Navegações e era pilotada pelo seu próprio proprietário, que sobreviveu ao naufrágio e está foragido.

 A informação que se tem é que a lancha estava com lotação muito acima do permitido no momento do naufrágio. Como todos os marajoaras sabem, essa é a regra. Não há nenhum controle por parte das autoridades que deveriam fiscalizar, as condições de manutenção são péssimas, nenhum protocolo de segurança é seguido. Essa mesma lancha que naufragou já havia sido multada três vezes por irregularidades, porém continuou operando normalmente, levando a que essa tragédia acontecesse.

Inclusive, esse transporte é tão comum que não deveria ser chamado de clandestino. Toda a fiscalização dos portos da região, seja municipal, estadual ou federal tem pleno conhecimento da situação e não faz absolutamente nada para resolver. Não é uma situação nova, pelo contrário, se prolonga há muitos e muitos anos. A população pobre da ilha de Marajó não tem outra alternativa que não seja recorrer a esse transporte perigoso. Os voos são muito caros e os navios (maiores e mais seguros) não dão conta do fluxo de passageiros, nem estão disponíveis nos horários necessários. Devido à precariedade dos serviços públicos oferecidos na ilha, muitos marajoaras necessariamente precisam deslocar-se frequentemente para Belém e a única alternativa é se submeter a essa viagem arriscada que, ao contrário do que se pode pensar, não é barata. Uma passagem numa lancha dessas é da ordem de 50 reais, um preço bastante alto para a realidade da maioria da população da região.

Em primeiro lugar, nos solidarizamos completamente com os familiares e amigos das vítimas do naufrágio e também exigimos das autoridades eficiência pelo menos no resgate dos corpos e no apoio aos sobreviventes e às famílias das vítimas fatais. Mas, para além disso é necessário que os culpados por esse assassinato coletivo sejam punidos. 
Além, obviamente, do dono da embarcação, toda a rede de fiscalização dos portos e hidrovias que não fiscaliza nada tem as mãos sujas de sangue. E os responsáveis são os prefeitos, tanto das cidades de Marajó (Carlos Gomes-Podemos, de Salvaterra, e Antônio Athar-MDB, de Cachoeira do Arari), quanto de Belém (Edmilson Rodrigues, PSOL), o governador Hélder Barbalho (MDB) e a Marinha do Brasil, a quem cabe fiscalizar o transporte marítimo e fluvial do país, ou seja, o próprio presidente Bolsonaro (PL).

 Além da punição de todos os culpados, é necessário impedir que tragédias como essa voltem a acontecer. É preciso garantir um transporte de qualidade, público, barato, seguro e pontual entre a ilha de Marajó e Belém. Além disso, é preciso melhorar a infraestrutura de serviços de saúde, bancários, etc na ilha para diminuir a necessidade de deslocamento da população para Belém.

 Por fim é necessário lembrar que, frente a uma situação trágica como essa, não houve nenhuma palavra de solidariedade ou de consolo por parte do genocida que ainda ocupa a cadeira presidencial do Brasil. No entanto, o mesmo se mostrou bastante sensibilizado com a morte da quase centenária rainha da Inglaterra, cúmplice de incontáveis barbaridades realizadas pelo império britânico ao longo do último século. Para homenagear parasita imperialista, Bolsonaro estabelece 3 dias de luto oficial. Para as dezenas de vítimas do povo pobre da Ilha de Marajó, nenhuma palavra, nenhum luto, nenhum socorro.

Só a luta das trabalhadoras e trabalhadores pode mudar esse estado de coisas. Os ricos só choram os seus. Não esqueceremos dos nossos.




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