Manifesto Fundacional - MARX BRASIL

 

 Nos quatro cantos do planeta, o sistema capitalista entrou em um ponto de inflexão que coloca para a humanidade a disjuntiva anunciada de forma brilhante pela revolucionária polonesa Rosa Luxemburgo: Socialismo ou Barbárie.

A nova forma de acumulação de capital, também chamada de Indústria 4.0 ou 4ª Revolução Industrial, combina avanços imprevisíveis da ciência e da tecnologia e um aumento sem precedente de desempregados, fome, colapso ambiental, racismo, xenofobia, machismo, lgbtfobia, opressão colonial, retirada de direitos trabalhistas, pandemias e uma violência estatal a serviço do acúmulo capitalista. Em outras palavras, todo desenvolvimento científico hoje não está a favor do desenvolvimento humano, senão do acúmulo de capital da única minoria realmente perigosa: a burguesia imperialista e seus asseclas nos países capitalistas dependentes.

Nesse cenário trevoso, milhões e milhões de trabalhadores, em sua ampla diversidade (mulheres, imigrantes, negros, indígenas, jovens, lgbts, etc) se lançam todos os dias às ruas, em todos os rincões do mundo, para lutar contra as mais violentas e bárbaras formas de exploração e opressão. No entanto, ao optar pelo enfrentamento direto contra o imperialismo, contra a política de miséria e fome, contra as opressões de toda a ordem, a classe trabalhadora se choca contra as forças políticas que defendem a forma política do capital - o Estado Burguês. Não é por outra razão que as massas no mundo todo enfrentam tanto os chamados “governos progressistas de esquerda” quanto os governos de direita e extrema-direita, enfrentam as burocracias partidárias adaptadas tanto ao parlamento burguês quanto ao sindicalismo comezinho.

Desse modo, em nosso juízo, a caracterização do revolucionário russo Leon Trotsky de que a crise da humanidade é a sua crise de direção revolucionária segue vigente e se aprofunda dia após dia. Na Síria, em Cuba, Palestina, na França, na Colômbia, Chile, Haiti, Sudão, Hong Hong, Venezuela, etc., a classe trabalhadora assume a táctica da luta direta sem, no entanto, encontrar uma força política que lhe apresente um programa capaz de romper com a lógica do capitalismo.

 Nesse deserto onde não há, de fato, partidos revolucionários, por um lado, o capital assume suas múltiplas faces e oferece às massas discursos religiosos, xenofóbicos, misóginos e anti-operários por meio de uma extrema-direita supostamente anti-sistêmica. E por outro lado, oferece discursos democráticos-burgueses nos quais as demandas da classe trabalhadora e de todos os oprimidos se resumem em ganhar eleições e prometer pequenas melhorias na vida dos mais “pobres e dos mais vulneráveis”.

De nossa parte denunciamos que esses são cantos da mesma sereia capitalista em diferentes tonalidades e que tentam desviar os trabalhadores e a juventude da única saída possível diante do prelúdio da barbárie que a burguesia mundial levará a espécie humana: a necessária destruição do sistema capitalista por meio da organização de todos aqueles que são explorados. Por essa razão, acreditamos que a tarefa primeira de qualquer organização que se pretende revolucionária é organizar aqueles que estão dispostos a lutar contra esse sistema e reagrupar aqueles que estão convencidos dessa necessidade, mas que estão dispersos.

 

O caráter da burguesia no Brasil e as tarefas dos revolucionários

Desde a invasão colonial europeia, no século XVI, nos territórios que atualmente chamamos de Brasil, essa região foi incorporada à lógica de acumulação capitalista. A colonização na América Latina e Caribe, na qual incluem as duas colônias portuguesas nas Américas (Grão Pará e Brasil Colônia) tiveram objetivos capitalistas combinados com relações de produção pré-capitalistas, isto é, produzir mercadorias para o mercado mundial mediante a escravidão negra e a servidão indígena. Isso implica que essa região fora agregada e submetida às necessidades dos centros mais dinâmicos do capitalismo desde os primórdios desse sistema, formando aqui uma burguesia intrinsecamente vinculada aos interesses e ao padrão cultural das grandes metrópoles, em outras palavras, uma burguesia essencialmente colonizada e racista.

Para evitar um levante popular semelhante ao que ocorrera na Revolução Haitiana, essa mesma burguesia apátrida e aculturada realizou um lento e controlado processo de transição da condição formal de colônia para a condição formal de uma República Independente.

Nesse sentido, a burguesia brasileira obteve êxito em manter suas relações com as principais economias imperialistas que surgiram no século XIX e XX (França, Inglaterra e EUA) às custas da escravidão negra, do extermínio físico e cultural dos povos indígenas e posteriormente da superexploração da força de trabalho de todos os trabalhadores.

Em sua essência, essa lógica da burguesia brasileira ainda se mantém no século XXI e agora se apresenta de maneira muito mais voraz. Com a ascensão da China como centro industrial do mundo, a realidade tripudia de todas as ilusões daqueles que acreditavam que a burguesia no Brasil poderia dirigir um projeto capitalista nacional-desenvolvimentista que permitisse um novo padrão de reprodução do capital, centrado na criação de um mercado interno e na valorização da força de trabalho local.

Se em si essas ilusões e quimeras cepalinas e nacionalistas, pregadas por parte da esquerda brasileira, são absurdas na perspectiva de classe, afinal uma burguesia nacionalista não anula a contradição entre capital e trabalho, agora quando fica visível que as forças políticas burguesas não apenas não dirigirão nenhuma mudança qualitativa do capitalismo no país, como se alinham ao rebaixamento do Brasil na divisão internacional do trabalho, enquanto um país predominantemente primário-exportador e de serviços, tais ilusões e quimeras tornam-se ridículas.

Seguros que na nova forma de acumulação de capital imposta pela Indústria 4.0 restará à burguesia brasileira sua total e irreversível condição de fornecedora de minério para os grandes centros industriais e para os polos tecnológicos, bem como de exportadora de carne e soja para alimentar a China e os EUA, todos os partidos da ordem, sem exceção, (Bolsonaro, PSDB, MDB, PT, PDT, PSOL, Solidariedade, etc.) apoiam, na prática, o desmatamento da Amazônia e a consequente destruição dos povos originários, se alinham com as seitas neopentecostais que são a base ideológica do avanço do agronegócio, do garimpo e do extrativismo madeireiro, aceitam o financiamento dos grandes bancos que por sua vez também financiam os ruralistas e desestimulam e freiam, via burocracias sindicais, as ocupações de fábricas quando essas fecham suas portas ou demitem em massa.

Essa burguesia, que um dia a esquerda sonhou ser uma burguesia progressista, é a mesma classe social que exporta carne enquanto os trabalhadores brasileiros passam fome, a mesma classe social que enriquece em plena pandemia com o aumento dos preços do gás, diesel e petróleo enquanto as mães trabalhadoras se ferem e morrem ao tentar cozinhar com álcool puro porque seu mísero salário não acompanha o aumento do custo de vida, a mesma classe social que encarcera e reprime, via Estado, crianças, jovens e mulheres pobres quando esses vasculham os lixos de supermercado para não morrerem de fome, a mesma classe social que militariza as favelas enquanto encomenda crimes de milicianos em bairros ricos.

Portanto, não semeamos ilusões nessa burguesia, tampouco em suas múltiplas formas políticas, ao contrário, semeamos contra ela e contra seus partidos e governos o mais legítimo, necessário e urgente ódio de classe.

E sabemos que o necessário, urgente e legítimo ódio de classe que nos referimos acima só se transformará em força política capaz de impor uma derrota histórica para o capital se aqueles e aquelas que se dispõem a organizar politicamente tal sentimento compreenderem quais são as dores e as chagas que o capitalismo provoca na classe operária brasileira. Dito de outro modo, se os revolucionários e revolucionárias entenderem a classe trabalhadora em sua totalidade histórica.

 

A luta contra o racismo na perspectiva revolucionária

Compreender a classe trabalhadora na totalidade histórica é compreender que a nossa classe não se resume a uma luta economicista, senão que inclui também a luta contra toda a ideologia burguesa que se materializa no cotidiano dos trabalhadores.

Quando dissemos que a acumulação de capital desde sua forma mercantil ocorrera mediante relações de produção pré-capitalistas, isto é, mediante a escravidão negra de origem africana e a servidão dos povos originários, a conclusão óbvia é que essa estrutura econômica capitalista no continente americano provocou concomitantemente o surgimento de um fenômeno até então desconhecido de boa parte da humanidade, a discriminação por fenótipo/raça (traços do rosto, tonalidade da pele, tipo de cabelo, etc.).

Assim, o racismo que surgiu das relações sociais de produção adotadas pelo capitalismo na colonização se tornou ao longo da história capitalista brasileira uma base ideológica que permitiu e ainda permite a burguesia dividir a classe operária brasileira com ideias racistas e submeter a graus elevados de exploração os trabalhadores negros e indígenas, em especial as mulheres, negando-lhes inclusive as condições necessárias para a reprodução de sua própria força de trabalho. Essa é a razão pela qual os trabalhadores não-brancos recebem os piores salários e são submetidos às piores condições de trabalho.

Nós da Organização Revolucionária Marx Brasil compreendemos, então, que uma das lutas do proletariado brasileiro é a luta severa e intransigente contra o racismo, pois na particularidade brasileira esse é também, além de uma forma ignóbil de opressão, um dos pilares estruturais do sistema capitalista. Por isso não temos nenhum acordo com as posições neo-estalinistas e nacionalistas burguesas que afirmam que a luta dos negros e dos indígenas são lutas “identitárias” ou pós-modernas, tampouco temos acordo com aqueles que acham que é possível derrotar o racismo sem romper com o capitalismo.

Como marxistas afirmamos que a luta contra racismo nada tem de identitarismo, seja essa expressão uma tentativa jocosa de negar a importância das lutas raciais, seja essa expressão uma tentativa liberal de negar o vínculo entre racismo e capitalismo. Para nós, o racismo tem múltiplas determinações, sendo a mais importante delas a formação social do capitalismo no Brasil, por essa razão sua destruição é inseparável da destruição das formas políticas e econômicas capitalistas.

Por isso  cerramos punho com o Movimento Negro na luta pelo fim da Polícia Militar, pelo fim do encarceramento da juventude negra, pela igualdade salarial entre trabalhadores de todas as raças, pela desmilitarização das favelas, defendermos o fim do genocídio indígena, a autodemarcação territorial, a autodeterminação dos povos originários que assim desejar fazê-lo, a autodefesa dos territórios ancestrais mediante o uso da força se assim os povos indígenas e quilombolas julgarem necessário, etc.

 

Em defesa da vida das mulheres trabalhadoras e contra toda forma de machismo

Assim como compreendemos que o racismo é inerente ao capitalismo, seguimos com um dos mestres do marxismo, Friedrich Engels, quando esse afirma que a opressão contra a mulher tem suas bases no surgimento da propriedade privada dos meios de produção. Isso significa que para nós é inseparável a luta contra o machismo da luta contra a propriedade burguesa que é a forma mais avançada de propriedade privada. É nesse sentido que nos assumimos como feministas marxistas, pois entendemos a opressão de gênero por meio das bases teóricas e programáticas que o marxismo revolucionário nos legou e as usamos na luta contra o machismo.

No Brasil e no resto do mundo as mulheres representam mais da metade da classe trabalhadora, o que implica em três questões centrais para os revolucionários: 1) são as mulheres trabalhadoras que estão na vanguarda da luta contra o machismo, afinal não foram as burguesas que pegaram em armas contra o Estado Islâmico no Curdistão, tampouco são as burguesas que lutam pela e precisam da descriminalização do aborto, que lutam a favor  da abolição da prostituição ou que reivindicam creches, salários iguais para trabalhos iguais, etc. Todas essas reivindicações tem como vanguarda o movimento de mulheres formado majoritariamente pelas mulheres trabalhadoras. 2) A burguesia não pode atender o conjunto das demandas das mulheres, pois isso implicaria em atender também as reivindicações trabalhistas de mais da metade da classe operária que é formada por mulheres; 3) O feminismo burguês defendido pelo imperialismo e pelos liberais não é parte da luta da Revolução de Mulheres que corre o mundo, mas a reação burguesa e de sua contrarrevolução para desviar essa revolução antes que ela atinja os demais pilares da sociedade capitalista.  

 Tal como nos ensinou a tradição genuinamente bolchevique, tradição essa que reivindicamos, a peleia contra o machismo deve ser parte do programa dos revolucionários, de tal maneira que esse programa nos organize contra o machismo imposto pela sociedade burguesa e patriarcal, bem como nos ajude a combater essa opressão dentro das fileiras revolucionárias. Entendemos que essa é uma luta das mulheres e homens da classe trabalhadora.

Desse modo, nós da organização Marx Brasil assumimos integralmente a luta das mulheres trabalhadores e nos colocamos a favor da abolição da prostituição, defendemos junto com as vítimas do tráfico de meninas e mulheres o fim das milionárias redes de tráfico de pessoas, defendemos a descriminalização do aborto, salário igual para trabalho igual, pleno emprego para todas as mulheres, inclusive para retirar as mulheres transexuais e as nossas meninas da prostituição, construção de creches como direito das nossas crianças, mas também como uma segurança para a mulher trabalhadora deixar seus filhos, redução da carga horária sem redução de salário para que as mulheres não sejam submetidas aos sub-emprego, escala móvel de salário e a construção de lavanderias públicas para que as trabalhadoras não sejam submetidas à tripla jornada de trabalho,  etc.

 

Em defesa da classe operária brasileira

       Desde o início da crise econômica mundial, a qual os agentes da burguesia no Brasil chamaram de “marolinha”, o capital demostrou que não hesitaria em atacar as mínimas condições de sobrevivência da classe trabalhadora. Hoje, quando a crise econômica é um fato agravado pela pandemia, os mais de 14 milhões de desempregados, 36 milhões de informais, os mais de 200 mil moradores de ruas, a fome, o rebaixamento salarial e o aumento do custo de vida são expressões cabais dos ataques capitalistas.

Nesse contexto, já não cabe a nenhum trabalhador com consciência de classe, a nenhum jovem que se rebela contra o sistema e muito menos a um revolucionário acreditar que as instituições do Estado Burguês irão nos tirar da tragédia humanitária que o capital nos colocou, pois esse Estado não é nada mais que o balcão de negócios dos grandes capitalistas e a forma política pela qual a burguesia nos ataca. Basta observar a atuação de suas instituições, ou seja, do parlamento, do judiciário e de todos os seus governos.

 Por isso, não acreditamos nas eleições burguesas como meio de resolver os verdadeiros problemas dos trabalhadores, tampouco acreditamos em uma atuação sindical “banho-maria” aquela com dia e hora marcada para acontecer, sempre de acordo com o calendário do Estado (data-base, acordo coletivo, etc.). Diante do apelo de massas que tem, entendemos que as eleições devam ser usadas para divulgar o programa dos revolucionários e não que o programa revolucionário deva se submeter às regras dessas eleições sujas marcadas pelos interesses dos grandes capitalistas. Do mesmo modo, acreditamos que os sindicatos devam estar a serviço de elevar a luta dos trabalhadores e seus enfretamentos com o capital,  transformar a luta econômica em uma luta política, ser de fato uma escola de guerra, tal qual nos ensinou Lenin, e não ser um amortecedor jurídico e político dessa luta.

Dessa maneira, voltamo-nos para os pilares programáticos do marxismo revolucionário e defendemos: 1) pleno emprego para todos os trabalhadores (sem distinção de gênero, raça, orientação sexual, etnia, idade, etc.); 2) escala móvel de salário para enfrentar  o aumento dos preços e do custo de vida em geral; 3) escala móveis das horas de trabalho sem redução de salário e obras públicas para garantir o emprego para todos; 4) expropriação das fábricas por meio da ocupação direta dos trabalhadores em caso de fechamento ou demissão em massa; 5) expropriação e estatização dos grandes bancos, bem como a reestatização dos bancos que foram privatizados a partir da ação direta dos trabalhadores contra o Estado capitalista; 6) autodefesa das organizações dos trabalhadores contra a força do Estado, contra os gangsters sindicais e também contra as milícias de caráter fascista que aterrorizam os bairros pobres; 7) expropriação do latifúndio, julgamento popular, prisão e justiçamento contra todos os seus jagunços e para os mandantes dos crimes contra os trabalhadores rurais, camponeses pobres e povos indígenas  

Temos claro que as demandas da classe operária no Brasil e no mundo vão além dos sete pontos aqui apresentamos. Todavia, não acreditamos ser possível avançarmos rumo à Revolução Socialista sem levantarmos esses pontos desde agora.

 

A urgência de reagrupar os revolucionários no Brasil

Como apontamos no início, a crise capitalista aprofundou a crise de direção revolucionária, parte significativa da esquerda abandonou as ruas e seus dirigentes se encastelam no parlamento e nos aparatos sindicais burocratizados. Para manter seus mandatos parlamentares e seus postos nos sindicatos, os partidos de esquerda adotam a táctica do vale tudo, fazem alianças espúrias com os partidos burgueses ou os apoiam eleitoralmente, fazem aliança prática com as grandes máquinas sindicais, mentem para as massas dizendo que é possível mudar a vida por meio das eleições, aceitam e encobrem casos de machismo, racismo e LGBTfobia dentro e fora do partido, atacam com calúnias os militantes de base que cobram politicamente os dirigentes e aceitam e submetem cada vez mais aos recursos do Estado, via fundo eleitoral, fundo partidário e contribuição sindical.

Enquanto isso, tais organizações reformistas e centristas se desmoralizam dia após dia diante das massas, pois não têm autoridade política, uma vez que não se apresentam nas lutas, tampouco se propõem a efetivamente dirigi-las contra o capital e o Estado.

Essa triste e medonha realidade da maioria dos partidos de esquerda, sejam eles estalinistas ou trotskistas, é sentida e percebida por vários militantes sinceros que são cotidianamente silenciados dentro desses partidos por meio de uma burocracia partidária formada por velhos burocratas que se escondem atrás de um passado imaginário, no qual supostamente eles dirigiram algum processo revolucionário, e por jovens burocratas carreiristas que veem na profissionalização partidária a promessa de vida fácil, na qual não precisarão se submeter ao cotidiano de trabalho extenuante que a maioria da classe operária está submetida.

O que muitas e muitos desses camaradas sinceros ainda não compreendem é que não há mais espaço político dentro dessas organizações para combater o transcurso irreversível de adaptação desses partidos ao regime democrático-burguês. Afinal, os velhos e jovens burocratas transformaram o regime partidário em centralismo burocrático, no qual são eles mesmos que decidem a política, fazem balanços “positivos” sobre a aplicação delas e assim se legitimam para continuar como dirigentes nos congressos partidários que são verdadeiras farsas de democracia interna.

Além disso, queremos dizer a esses camaradas que estão desiludidos e desesperançados que a burocratização e socialdemocratização dos partidos de esquerda têm bases concretas na realidade objetiva.

As razões que explicam o processo em curso de socialdemocratização desencadeado dentro dos partidos de esquerda, incluindo os partidos trotskistas, são as enormes mudanças que causaram a situação objetiva global. A combinação da crise mundial do capitalismo com o processo revolucionário mundial acelera a virada para a direita de todas as direções contrarrevolucionárias, e também de todos os grupos revisionistas. É isso que explica o avanço em direção à socialdemocratização e a desintegração da esquerda em múltiplas pequenas correntes em escala internacional.

Os grupos revisionistas e centristas evoluem para grupos reformistas exatamente no momento preciso em que a crise mundial do capitalismo liquida e ameaça todos os projetos "reformistas". Com o desenvolvimento da crise mundial do capitalismo não há espaço, nem brechas para desenvolver reformas ou melhorias de qualquer tipo.

Pelo contrário, estamos perante um ataque brutal às condições de vida de milhões, que não abre espaço para negociações e "tréguas", liquidam todas as ilusões parlamentares, reformistas ou sindicais. Ao renunciar ao projeto revolucionário e adotar o reformista, os grupos revisionistas aprofundam sua crise, atingidos pela crise do capitalismo.

Um componente do processo revolucionário mundial que agrava a crise dos grupos revisionistas e centristas é a Revolução Feminina. Milhares de mulheres, trans, lésbicas e ativistas jovens descobrem que os grupos de esquerda são sexistas, que na verdade defendem os abusadores, quando por exemplo, se opõem que as mulheres os denunciem publicamente, que esses grupos de esquerda, na verdade e desgraçadamente, são, na prática, defensores da legalização da prostituição quando seus dirigentes se utilizam dessa asquerosa prática.

 A consequência disso é que os grupos que se dizem revolucionários e da esquerda combativa são rejeitados por milhares de lutadores e dirigentes das lutas contra as opressões que trazem consigo valiosos dirigentes e quadros que, com a mesma rapidez que ingressam também saem dessas organizações profundamente desiludidos.

Por outro lado, a ascensão das massas é cada vez mais operária, dos trabalhadores precários e urbanos. Isso agrava a crise dos grupos que se recusam a intervir nas organizações de massa e se refugiam a procura de outros sujeitos sociais (o intelectual acadêmico, o general progressista, o sindicalista burocratizado, o parlamentar de discurso revolucionário, o líder populista carismático, etc.).

 O processo de socialdemocratização da esquerda expressa as pressões de classe do imperialismo e da frente contrarrevolucionária mundial sobre as organizações operárias e populares. Diante do processo revolucionário mundial, o imperialismo concede, de forma limitada, onde não pode evitá-lo, apenas duas brechas para a atividade política: a atividade sindical e a atividade parlamentar. O processo de socialdemocratização expressa a adaptação dos dirigentes a essas pressões do imperialismo.

Os grupos revisionistas de esquerda limitam suas ações a aproveitar essas lacunas limitadas que o imperialismo possibilita às organizações sindicais dentro das diretrizes do Estado Burguês. Os dirigentes sindicais que estão no cargo há muitos anos e não realizam uma política de transformação dos sindicatos, adaptam-se à estrutura que lhes é imposta pelo Estado burguês e se burocratizam.

O giro abertamente socialdemocrata da direção dos grupos revisionistas se expressa na medida em que priorizam a atividade parlamentar e sindical, em detrimento da luta pela liderança do movimento operário e popular. Para cobrir sua trajetória socialdemocrata às vezes levantam slogans ultra-esquerdistas, se disfarçam de vermelhos, fazem plenárias "combativas", mas tudo isso é um disfarce para cobrir sua adaptação porque tendem a se burocratizar, e se adaptam ao regime.

Os recursos que recebem do Estado burguês levam essas organizações a montar um aparato partidário desproporcional em relação ao número de militantes, e ao seu real peso na luta de classes. A estrutura socialdemocrata avança na medida em que cresce a quantidade de rendimentos, servidores públicos, aparato editorial e atividades culturais e intelectuais que dependem do Estado Burguês.

O partido perde autonomia diante do Estado Burguês e passa a depender profundamente das instituições do Estado, deixa de ser um aparelho conspiratório, a serviço do armamento das massas, greves, auto-organização ou piquetes e passa a ser um aparelho socialdemocrata.

Na medida em que, como resultado da intervenção parlamentar, os cofres das organizações partidárias se enchem de dinheiro com a renda dos parlamentares, das contribuições sindicais indiretas, o caminho para a direita se acelera, as organizações se negam cada vez a lutar pela liderança das lutas nos sindicatos, dos movimentos e nas organizações de massa. Por isso, nas organizações de massa essas correntes ora adotam uma política ultraesquerda para justificar sua não-intervenção, ora se deixam dirigir pela própria burocracia sindical, como acontece com frequência no Brasil diante dos aparatos sindicais petistas. Tudo isso para esconder que o pano de fundo é a sua adaptação ao regime burguês.

Com o avanço do revisionismo dentro das organizações de esquerda que se dizem revolucionárias, seu giro socialdemocrata se acentua e o regime interno dessas organizações se torna mais antidemocrático. Quando surgem setores de quadros e militantes que percebem o rumo oportunista e tentam modificá-lo, esses são brutalmente reprimidos pelas direções revisionistas, burocráticas e autoritárias. Tais direções impõem, então, um centralismo burocrático e estalinista, reformam os estatutos de forma não democrática, impedem debates, impõem sanções, expulsões, o que dá origem a divisões, rupturas e crises.

Como resultado desse processo, vários militantes se afastam "silenciosamente" dessas organizações e algumas correntes e camaradas tiram de tudo isso a conclusão errada de que as organizações revolucionárias não têm que intervir nas eleições, nem ter deputados, nem dirigir sindicatos ou federações sindicais. E não precisa ter aparato nem recursos porque isso leva à burocratização. Todas essas conclusões estão erradas.

A história das correntes revolucionárias mostra que é preciso construir um aparato e ter profissionais para liderar as insurreições e as greves, o que não pode ser feito sem uma organização forte. Os deputados e dirigentes sindicais são táticas necessárias ​​para apoiar as lutas das massas.

Para nós da Marx Brasil, o problema não é intervir nas eleições, nem ter deputados, nem dirigir sindicatos, nem ter aparatos e profissionais. O que destrói o regime partidário é a intervenção do Estado Burguês na estrutura partidária que leva à burocratização de seus dirigentes. E para que o partido mantenha um método saudável, a direção deve ampliar o polo democrático do regime de funcionamento interno, o que permite maior controle dos quadros médios e da base partidária sobre a direção.

Estimamos que nos últimos anos, por essas razões, centenas ou quiçá milhares de militantes romperam com os grupos revisionistas e centristas. Temos que agir com ousadia nessa crise, sem sectarismo, para recuperar esses quadros e militantes. Queremos debater com esses militantes, oferecer a eles nossos materiais, deixando para trás o passado e os confrontos que talvez tenhamos vivido em outros anos, debatendo o presente e como reconstruir o marxismo revolucionário.

Acreditamos que devemos reagrupar pacientemente todos esses camaradas que rompem com as organizações revisionistas e centristas em dolorosos processos que muitas vezes os deixam cansados, desconfiados e confusos. Afinal, nós militantes da Marx Brasil também somos parte desse processo e dessas rupturas.

Por isso, as tarefas mais urgentes que a Organização Revolucionária Marx Brasil coloca para si é reagrupar os revolucionários e os novos lutadores que surgem da classe trabalhadora. Nossa organização é uma organização embrionária no Brasil, mas que nasce com laços políticos importantes em nível internacional, somos parte da corrente política La Marx Internacional e estamos presentes na Argentina, Costa Rica, no México, na Colômbia, Chile, Bangladesh, Peru, Equador, Cuba, Panamá, atuamos em sindicatos do campo e da cidade e dirigimos a Plataforma Internacional de Mulheres Trabalhadoras contra o Tráfico de Pessoas e contra as Redes de Prostituição.

No Brasil, convidamos a construir conosco uma verdadeira organização revolucionária todos aqueles e aquelas que desejam lutar contra o capitalismo por meio da independência de classe, por dos métodos da luta direta da classe operária e por meio da compreensão que a classe trabalhadora é múltipla e diversa e que todas as suas lutam são importantes, contra a exploração e contra a opressão.

 

Vida longa aos revolucionários no Brasil e mundo!

Morte ao capital!

Viva o socialismo e a classe trabalhadora organizada!

 

 

MARX BRASIL

LA MARX INTERNACIONAL

 

São Paulo, novembro de 2021

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